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domingo, 28 de agosto de 2011

'Planeta dos Macacos: a Origem' traduz medo real da ciência

A cena do filme "Planeta dos Macacos: A Origem" mostra o chimpanzé Caesar, cuja história fictícia representa uma discussão real do mundo científico.
Com a estreia de Planeta dos Macacos: A Origem nos cinemas brasileiros nesta sexta-feira, o público poderá acompanhar a história do chimpanzé Caesar, que desenvolve uma inteligência quase humana e começa uma revolução para dominar o mundo. Apesar do apelo cinematográfico, a trama pode estar mais próxima da realidade do que parece. O filme chega ao Brasil um mês depois de a Academia de Ciências Médicas da Grã-Bretanha ter publicado um pedido ao governo britânico para repensar as leis que regem as pesquisas médicas com animais. Entre as preocupações dos cientistas ingleses, está a possível criação de animais com inteligência humana.
O professor Thomas Baldwin, um dos membros da academia, disse à BBC que o grupo teme "que se comece a introduzir um grande número de células cerebrais humanas no cérebro de primatas e que isso faça com os que os primatas adquiram algumas das capacidades que se consideram exclusivamente humanas, como a linguagem". Apesar de ser uma preocupação a longo prazo, o professor acredita que já devemos começar a pensar em como regular estas pesquisas.
A opinião é compartilhada pela brasileira Lygia Pereira, coordenadora do departamento de Genética e Biologia Evolutiva da Universidade de São Paulo (USP). Para a pesquisadora, a criação de seres híbridos com células animais e humanas "é uma preocupação atual" no meio científico e devem haver limites claros para os testes em laboratório. De acordo com Lygia, não há problema em implantar células humanas em animais, desde que elas não interfiram no sistema nervoso ou no sistema reprodutivo do receptor. Caso isso acontecesse, poderíamos criar os cinematográficos chimpanzés com capacidades cognitivas avançadas ou ainda um camundongo capaz de produzir espermatozoides humanos.
Transgênicos e quimeras
Um símio inteligente como o fictício Caesar seria, provavelmente, uma quimera: um animal com células humanas. O termo quimera vem da criatura mítica grega cujo corpo misturava diversas criaturas. Algumas versões a apresentam como uma mistura entre mulher, serpente e égua, outros a desenham como a junção de um leão com serpentes, entre outras variações. Hoje, o termo é utilizado no meio científico. As quimeras são diferentes dos animais transgênicos, que não possuem células de outros animais, apenas genes externos inseridos em seu código genético.
A criação de animais transgênicos é bem menos controversa que a criação de quimeras, já que alterações genéticas não levam ao desenvolvimento da inteligência ou de células reprodutivas. No Brasil, diversas pesquisas utilizam camundongos transgênicos, e ainda esse ano, o País contará com um centro de produção de camundongos sob encomenda, que será parte do LNBio (Laboratório Nacional de Biociências), em Campinas. Cientistas poderão pedir ao centro que produza animais com alterações específicas que sirvam ao estudo de determinadas doenças.
O primeiro camundongo transgênico brasileiro foi criado em 2001 na USP, pela equipe coordenada por Lygia Pereira. Quase ao mesmo tempo, a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) criou seu próprio camundongo transgênico, sob a liderança de João Bosco Pesquero. Desde lá, diversos transgênicos foram criados nas universidades para pesquisas médicas e, de acordo com Pesquero, a Unifesp tem planos de começar a utilizar coelhos em suas pesquisas.
Avanços brasileiros com transgênicos
Entre as criações da Unifesp, Pesquero destaca um camundongo capaz de dar leite com uma proteína humana necessária na coagulação do sangue. O animal teve seu DNA alterado com uma mutação no fator 12 do código genético e passou a produzir a proteína que pode ser usada no tratamento de doenças do sangue, como a hemofilia. A pesquisa foi feita como um teste prévio para a criação de uma vaca, mas o projeto com bovinos, que não era da universidade, acabou não tendo prosseguimento.
Mas a experiência abriu caminho para novas pesquisas em animais biorreatores, aqueles que produzem substâncias que servem a medicamentos. O próximo projeto é criar um coelho biorreator. "Precisamos diminuir a dependência externa", defende Pesquero, que aponta a demora em conseguir modelos do exterior como o maior problema na falta de produção própria de animais transgênicos.
A polêmica dos híbridos
"O que nos define como humano?" pergunta Lygia Pereira, fazendo eco às preocupações da academia britânica que já prevê que, se começamos a criar quimeras, precisaremos decidir que porcentagem de células humanas em um ser vivo lhe concede, por exemplo, direitos humanos.
Entretanto, o tema não parece problemático para o cientista Desmond Morris, zoólogo que ficou famoso ao apresentar os primeiros programas de TV sobre o mundo animal, nos anos 1960. Em artigo publicado pelo jornal britânico The Sun, Morris diz que não vê problemas em gerar criaturas que sejam fruto de animais com humanos. Para ele, o medo de fertilizar um óvulo de chimpanzé com esperma humano existe apenas porque "nos negamos a aceitar que humanos são animais".
Quanto aos perigos retratados no filme Planeta dos Macacos: A Origem, o britânico disse que as chances de sermos dominados por chimpanzés é "nula". Para ele, mesmo no caso de um símio adquirir características humanas, ele ganharia também os traços amigáveis, dóceis e cooperativos da espécie humana e dificilmente iniciaria uma revolução. Mesmo assim, ele chama a atenção para o fato de que muitos dos testes realizados em laboratório causam sofrimento aos animais. "Preferimos fechar os olhos porque desfrutamos dos benefícios das novas descobertas da medicina moderna", afirmou.

Fonte: Julia Dantas - Terra Notícias

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