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quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Existe língua brasileira?

Existe língua brasileira?
Talvez sim. Talvez não.
Aqui no Brasil nós ainda falamos a língua portuguesa. Temos, na minha opinião, um falar brasileiro, que seria um modo brasileiro de usar a língua portuguesa.
O português culto do Brasil é bem semelhante ao português culto de Portugal. Isso significa, portanto, que as diferenças maiores estão na linguagem do dia a dia.
O que existe são variantes linguísticas:
a)    variantes geográficas: nacionais (Brasil, Portugal, Angola…) e regionais (falar gaúcho, mineiro, baiano, pernambucano…);
b)    variantes socioeconômicas (vulgar, popular, coloquial, culto…);
c)    variantes expressivas (linguagem da prosa, linguagem poética).
O importante mesmo é respeitar as diferenças, sejam fonéticas, semânticas ou sintáticas. Vejamos rapidamente algumas diferenças entre o português do Brasil e o de Portugal.
Uma diferença fonética bem “visível” é a pronúncia das vogais. Aqui no Brasil, nós pronunciamos bem todas as vogais, sejam tônicas ou átonas. Em Portugal, a tendência é só pronunciar bem as vogais tônicas. As vogais átonas são verdadeiramente átonas (=fracas). Uma consequência disso é a colocação dos pronomes átonos (me, te, se, o, lhe, nos…). Em Portugal, por ter a pronúncia fraca, não se põe o pronome átono no início da frase: “Dê-me um cigarro”; no Brasil, como as vogais átonas são pronunciadas como se fossem tônicas, não temos nenhuma dificuldade em pôr os pronomes átonos no início da frase: “Me dá um cigarro”. É assim que o brasileiro fala. E quando me refiro ao brasileiro, estou falando do brasileiro em geral, de todos os níveis sociais e culturais. Não estou fazendo referência ao “povo” com aquela conotação pejorativa e discriminatória que alguns ainda atribuem à palavra.
Diferenças semânticas existem muitas. Algumas famosas já viraram até piada. Em Portugal, “uma bicha enorme” não é nada mais do que “uma fila imensa”, sem nenhuma outra conotação que algum brasileiro queira dar.
E diferenças sintáticas também existem. No Brasil, nós preferimos o gerúndio (“Estamos trabalhando”); em Portugal, preferem o infinitivo (“Estamos a trabalhar”). No Brasil, gostamos da forma “você”; em Portugal, usam mais o pronome “vos”: “Se eu lesse para vocês” e “Se eu vos lesse”. Aqui “falar consigo” é “falar com si mesmo”; em Portugal “falar consigo” é “falar com você”. Em Portugal, é frequente o uso de “mais pequeno”; no Brasil, aprendemos que o certo é falar “menor”, que “mais pequeno” é “errado”.
E assim voltamos ao ponto de partida: a eterna briga do certo e do errado. Espero que me perdoem pela repetição, mas não é uma questão simplista de certo ou errado. É uma questão de adequação. Usar “mais pequeno” no Brasil é tão inadequado quanto iniciar uma frase com um pronome átono em Portugal.
Por que eu teria de afirmar que alguém está falando “errado” quando o carioca fala “sinal”, o paulista prefere “farol” e o gaúcho usa “sinaleira”? Afinal das contas, é tudo semáforo.



Texto de Sérgio Nogueira

2 comentários:

  1. Excelente!
    Eu moro na Europa e muitas vezes assisto a DVDs em português de Portugal. No começo as diferenças eram mais gritantes, agora já acostumei, mas nunca tinha entendido esse uso específico de gerúndio e infinitivo.
    Um abraço,
    Adri

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  2. Consideremos a Língua Portuguesa como sendo uma grande árvore. O tronco é comum, porém os galhos..Valha-me Deus!, ou "Ai Jesus!. Acho que querem massacrar nossos irmãos de Portugal com milhares de palavras que eles desconhecem. No Brasil temos centenas de palavras de origem tupi-guarani. origem africana por conta dos escravos, origem italiana, espanhola, japonesa, libanesas etc por conta das imigrações e por aí vai. Temos ainda palavras introduzidas por conta das indústrias que investiram no Brasil, enfim, daqui temos que exportar palavras para Portugal. Sem considerar que existem muitas palavras que são totalmente diferentes. Segundo informações que colhi (alguém me corriga se erro) podemos chegar ao ponto de não entender a "mesma língua" com as diferenças:goleiro (Brasil) - guarda-redes (Portugal). Gramado = relvado, bola = esfera, gol = golo, crianças = miúdos, camiseta do jogo= camisola, vermelha = encarnada, meias = peúgas, acostamento = bermas. Parece que no restaurante a coisa se complica mais...(Não critico pejorativamente, pois acho que isso enriquece os lados)
    Leonilldo

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