O país sai partido ao meio – e a maior culpa cabe ao PT com a política do “nós” contra “eles”.
Ricardo Noblat
No domingo 21 de abril de 1985, o presidente Tancredo Neves agonizava em um hospital de São Paulo enquanto eu me preparava para escrever a coluna do Jornal do Brasil chamada “Coisas da Política”.
Tancredo poderia morrer a qualquer hora. A coluna deveria ficar pronta até às 20 horas.
No primeiro parágrafo da coluna intitulada “Viva Tancredo”, ele estava vivo, embora inconsciente. Foi morrendo. Morreu no último parágrafo.
São 14h30 deste domingo 26 de outubro de 2014. Tudo que sei até agora é que nada sei sobre a eleição ainda em curso do presidente da República – Dilma ou Aécio Neves.
O Ibope, ontem, conferiu a Dilma seis pontos de vantagem, para além do empate técnico. O Datafolha, quatro. Empate técnico, pois, dentro da margem de erro de dois pontos percentuais para lá ou para cá.
O Instituto Sensus pôs Aécio quatro pontos na frente.
Espantado com a discrepância dos resultados das pesquisas? Esse é o ramo do crime perfeito. Se você acertar, acertou. Louve-se sua competência.
Se errar, foi o distinto eleitor que resolveu mudar de posição no último minuto. A culpa é dele.
Instituto que faz pesquisas para veículos de comunicação deveria se declarar impedido de simultaneamente fazer pesquisas para partidos políticos. Pega mal, convenhamos. Dá margem à suspeição.
São 15h28. Avisaram-me que a coluna deve ser fechada, no máximo, às 20 horas. A Justiça Eleitoral prevê que o primeiro boletim com resultados parciais da eleição será divulgado às 20h.
Se tivermos, de fato, diante de uma eleição apertada, como será? O que faço? Ponho um ponto final nesta coluna sem dizer quem venceu? Você me desculpará por isso?
Falando em desculpa, Lula chamou a revista VEJA de leviana por ter publicado trechos da confissão à Justiça do doleiro Alberto Yousseff, um dos operadores do esquema que desviou mais de R$ 10 bilhões da Petrobras para enriquecer políticos.
Yousseff revelou que Lula e Dilma sabiam de tudo.
Outro dia, Lula explicou que leviana tem a ver com prostituta. E recriminou Aécio por ter chamado Dilma de leviana.
Mentira de Lula – mais uma das tantas que ele propaga quase todo o dia. E de cara limpa.
Leviana quer dizer imprudente, precipitada, em seriedade. Faz sentido chamar Dilma de leviana.
Ela sugeriu, por exemplo, que Aécio bate em mulher. Não foi uma leviandade?
Dilma ouviu militantes do PT gritarem em coro que Aécio é viciado em cocaína. Leviandade de quem gritou. Cumplicidade de quem ouviu sem protestar.
São quase 17 horas. A votação está chegando ao fim – menos no Acre com seu fuso horário de menos de três horas em relação ao horário de Brasília.
A essa altura, Dilma e Aécio fazem uma ideia de quem ganhará. Farão mesmo?
Diga-me uma coisa: choveu no Nordeste? A abstenção ali, no maior reduto eleitoral de Dilma, terá sido maior do que o esperado?
E em Minas Gerais, onde Aécio não elegeu o governador e ainda perdeu a eleição para presidente no primeiro turno?
Vença quem vencer, Dilma e o PT enfrentarão tempos difíceis. Por causa deles, vem por aí um obrigatório e duro ajuste na economia que atravessará os próximos dois anos.
Sem falar de uma crise política destinada a se transformar numa crise institucional dado os efeitos do escândalo da Petrobras sobre o Congresso e figuras coroadas do poder nacional.
Os donos do poder estão em pânico. E com razão. As maiores empreiteiras corromperam e se deixaram corromper.
Êpa! Quem se elegeu?
Está na hora de fechar a coluna. Vai assim. Foi.
Se der, acrescentem: “Dilma se elegeu. O medo venceu a mudança”. Ou então: “Aécio se elegeu. A mudança venceu o medo”.
Num caso como no outro, o país sai partido ao meio – e a maior culpa cabe ao PT com a política do “nós” contra “eles”.
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